quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Porque criacionistas e evolucionistas não se entendem

EVOLUTION, as understood by a Creationist:

A few hundred years ago, deep in the jungle, a girl monkey goes into labor.

Monkey Boyfriend: You can do it, sweetie.

With a loud monkey noise, she gives birth.

Monkey Doctor: It's a new species!

Monkey Boyfriend: We'll call it humans.

An elderly fish enters, pats the chimpanzee on the back.

Fish: I'm proud of you, son.

Monkey Boyfriend: Thanks, dad.

(SIDE NOTE: The monkeys are not married.)

Years later, the human boy is cornered by some predators.

Human boy: Crap. Better evolution-ize.

The boy evolves some laser eyes, or possibly wings. He easily defeats all the predators.



CREATIONISM, as understood by an evolutionist:

A kindly, bearded white man in a pointy hat and starry robe appears.

God: Sup.

He pulls out a small, oak wand and waves it around.

God: Expecto existentia!

America is created, as well as some other stuff.

Adam: Wait, what about these?

Adam holds up some large bones.

God: Oh, those? Millions of years ago, a massive race of dragon-like animals roamed the Earth. Then they all died in a mass extinction. Same thing could happen to you, actually.

Adam: Really?

God: Naw, I just put those there as a goof. Now go start writing the Bible. It's already 4,000 B.C., there's no time to waste.

Adam: What does the "B.C." stand for?

God: Ah, you'll figure it out.

Fonte: http://www.collegehumor.com/article:1776683

sábado, 4 de julho de 2009

Pale Blue Dot

Filme produzido por Michael Marantz, leitura de Carl Sagan.

"We were hunters and foragers. The frontier was everywhere. We were bounded only by the Earth, and the ocean, and the sky. The open road still softly calls. Our little terraquious globe as the madhouse of those hundred thousand millions of worlds. We, who cannot even put our own planetary home in order, riven with rivalries and hatreds; Are we to venture out into space? By the time we're ready to settle even the nearest of other planetary systems, we will have changed. The simple passage of so many generations will have changed us. Necessity will have changed us. We're an adaptable species. It will not be we who reach Alpha Centauri and the other nearby stars. It will be a species very like us, but with more of our strengths, and fewer of our weaknesses. More confident, farseeing, capable, and prudent. For all our failings, despite our limitations and fallibilities, we humans are capable of greatness. What new wonders, undreamt of in our time, will we have wrought in another generation? And another? How far will our nomadic species have wandered by the end of the next century? And the next millennium? Our remote descendants, safely arrayed on many worlds through the solar system and beyond, will be unified by their common heritage, by their regard for their home planet, and by the knowledge that whatever other life there may be, the only humans in all the universe come from Earth. They will gaze up, and strain to find the blue dot in their skies. They will marvel at how vulnerable the repository of raw potential once was. How perilous, our infancy. How humble, our beginnings. How many rivers we had to cross before we found our way."



"From this distant vantage point, the Earth might not seem of any particular interest. But for us, it's different. Consider again that dot. That's here. That's home. That's us. On it everyone you love, everyone you know, everyone you ever heard of, every human being who ever was, lived out their lives. The aggregate of our joy and suffering, thousands of confident religions, ideologies, and economic doctrines, every hunter and forager, every hero and coward, every creator and destroyer of civilization, every king and peasant, every young couple in love, every mother and father, hopeful child, inventor and explorer, every teacher of morals, every corrupt politician, every superstar, every supreme leader, every saint and sinner in the history of our species lived there - on a mote of dust suspended in a sunbeam. The Earth is a very small stage in a vast cosmic arena. Think of the rivers of blood spilled by all those generals and emperors, so that, in glory and triumph, they could become the momentary masters of a fraction of a dot. Think of the endless cruelties visited by the inhabitants of one corner of this pixel on the scarcely distinguishable inhabitants of some other corner, how frequent their misunderstandings, how eager they are to kill one another, how fervent their hatreds. Our posturings, our imagined self-importance, the delusion that we have some privileged position in the Universe, are challenged by this point of pale light. Our planet is a lonely speck in the great enveloping cosmic dark. In our obscurity, in all this vastness, there is no hint that help will come from elsewhere to save us from ourselves. The Earth is the only world known so far to harbor life. There is nowhere else, at least in the near future, to which our species could migrate. Visit yes. Settle, not yet. Like it or not, for the moment the Earth is where we make our stand. It has been said that astronomy is a humbling and character building experience. There is perhaps no better demonstration of the folly of human conceits than this distant image of our tiny world. To me, it underscores our responsibility to deal more kindly with one another, and to preserve and cherish the pale blue dot, the only home we've ever known."

A música é melosa, mas a idéia do pálido ponto azul é legal. Carl Sagan fez bastante lobby para que a sonda Voyager 1 virasse e tirasse uma foto da Terra vista de muito longe, para inspirar nas pessoas o sentimento tão comum entre os astrônomos e astrofísicos: a Terra é apenas mais um frágil e minúsculo ponto azul em um imenso universo. Somos apenas uma pequena parte dele. A Voyager já saiu do sistema solar e leva consigo um disco de cobre e ouro com imagens e sons da Terra. O cartão de visitas do pálido ponto azul para as outras civilizações.

Fonte: http://www.geeksaresexy.net

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Pausa na série

Richard Feynman era conhecido por ser um ladies man.

Não sou muito familiar com o trabalho de John Nash, mas quem viu A Beautiful Mind vai entender melhor a tirinha abaixo:

Fonte: http://xkcd.com/182/

sábado, 27 de junho de 2009

Episódio 1 - O primeiro NERD: traduzindo a beleza da Natureza

"Vamos supor: você é, pela graça de Deus, Vitória, rainha do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda, defensora da fé, na era mais próspera e triunfante do Império Britânico. Os seus domínios se estendem pelo planeta. O mapa-múndi está todo salpicado com o rosa britânico. Você governa a principal potência tecnológica do mundo. A máquina a vapor é aperfeiçoada na Grã-Bretanha, em grande parte por engenheiros escoceses - que fornecem o conhecimento técnico necessário nas ferrovias e nos vapores que ligam todo o Império.

Vamos supor que no ano de 1860 você [a rainha Vitória] tem uma idéia visionária, tão ousada que teria sido rejeitada pelo editor de Júlio Verne. Você quer uma máquina que transporte a sua voz, bem como imagens em movimento da glória do Império, para dentro de cada casa do reino. Além disso, os sons e as imagens não devem passar por condutos ou fios, mas vir pelo ar - para que as pessoas possam receber mensagens inspiradoras instantâneas, destinadas a assegurar a lealdade e a ética no trabalho. A palavra de deus também poderia ser transmitida pela mesma invenção. Sem dúvida, outras aplicações socialmente desejáveis seriam encontradas.

Assim, com o apoio do primeiro-ministro, você reúne o gabinete, o estado-maior imperial e os principais cientistas e engenheiros do Império. Você vai alocar 1 milhão de libras para esse projeto, é o que lhes comunica - muito dinheiro em 1860. Se precisarem de mais, é só pedir. Você não quer saber como eles vão criar o mecanismo; que o inventem tão-somente. Oh, sim, vai ser chamado de Projeto Westminster.

Provavelmente, algumas invenções úteis emergeriam de todo esse empenho - "produtos secundários". Eles sempre aparecem, quando se investem imensas somas em tecnologia. Mas o Projeto Westminster fracassaria com quase toda certeza. Por quê? Porque a ciência subjacente não fora desenvolvida. Em 1860, o telégrafo já existia. Podiam-se imaginar, a um custo muito elevado, aparelhos de telegrafia em cada lar, as pessoas fazendo pontos e traços para enviar mensagens em código morse. Mas não era isso o que a rainha queria. Ela tinha em mente o rádio e a televisão, mas eles estavam muito fora de alcance.

No mundo real, a física necessária para inventar o rádio e a televisão viria de uma direção que ninguém poderia ter previsto.

James Clerk Maxwell nasceu em Edinburgh, na Escócia, em 1831. Com dois anos de idade, descobriu que podia usar um pedaço de lata para fazer a imagem do Sol ricochetear na mobília e dançar contra as paredes. Quando seus pais chegaram correndo, ele gritava: "É o Sol! Eu peguei o Sol com o pedaço de lata!". Na sua infância, ele era fascinado por insetos, larvas, pedras, flores, lentes, máquinas. "Era humilhante", lembrou mais tarde sua tia Jane, "ouvir tantas perguntas que não se conseguia responder de uma criança assim".

Naturalmente, quando entrou para a escola, ele já era chamado "Dafty" - sendo daft uma expressão britânica para quem não é bom da cabeça. Ele era um jovem excepcionalmente bonito, mas vestia-se com desleixo, procurando antes o conforto que a elegância, e seus regionalismos escoceses no modo de falar e na conduta eram objeto de zombaria, especialmente depois que entrou para a universidade. E ele tinha interesses peculiares.

Maxwell era um nerd."
Carl Sagan, O Mundo Assombrado pelos Demônios - 1996

O que a rainha Vitória queria era uma tecnologia capaz de transmitir sinais à distância pelo ar. Hoje se faz isso usando ondas de rádio que carregam sinais de televisão, rádio, internet, gps etc. Essas ondas de rádio são exatamente idênticas às ondas luminosas que nossos olhos conseguem enxergar, exceto pela sua frequência.

A luz que vem do Sol, das lâmpadas elétricas, do fogo, da tela do computador e que reflete nos objetos nos permitindo ver o que nos cerca, possui a mesma natureza eletromagnética que compõe as ondas de rádio, as microondas, os raios ultravioleta (UV que causam câncer de pele) e infravermelhos e até os raios-x: tudo isso é luz. Só que nossos olhos não possuem células capazes de enxergar luz em frequências além das ditas visíveis (obviamente).

Mas por que se usa ondas de rádio para enviar sinais de TV e rádio e emitir pulsos de radar? Porque as ondas de rádio possuem frequências baixíssimas (longos comprimentos de onda) e quanto maior o comprimento da onda, maior o seu alcance.

Essa noção de que a eletricidade e o magnetismo se unem para formar a luz foi uma das inúmeras contribuições de Maxwell para o conhecimento científico. Ele não tinha interesse em descobrir particularmente a natureza da luz. Estava apenas curioso por entender como a eletricidade gera magnetismo e vice-versa. A curiosidade de um cientista (de um NERD!) foi mais que suficiente para resolver o problema que tornou os milhões de libras e os melhores engenheiros da rainha completamente impotentes.

Maxwell compilou o conhecimento produzido pelo físico dinamarquês Hans Christian Örsted sobre o fenômeno da indução magnética e as descobertas do físico inglês Michael Faraday que complementavam as experiêcias de Örsted produzindo indução elétrica. O nerd primordial conseguiu sintetizar tudo o que era conhecido sobre eletricidade e magnetismo na sua época (acrescentando suas próprias correções) e escreveu as suas famosas quatro equações:


São necessários alguns anos de estudo de física e matemática para entender realmente estas equações, mas para o propósito desse post, basta que o leitor saiba preencher as lacunas.

Faça-se saber que E representa o vetor campo elétrico e B representa o vetor campo magnético.

A primeira das equações acima se chama lei de Gauss e diz que a divergência do campo elétrico é igual a densidade de carga envolvida por uma tal superfície chamada superfície gaussiana. Em outras palavras, uma carga elétrica gera um campo elétrico. Esta equação praticamente define a divergência. A divergência pode ser entendida como um operador que mede a intensidade da fonte geradora de um campo. No caso da lei de Gauss esse campo é o campo elétrico. Tente atravessar essa conversa matemática, caso você não tenha treinamento nessa área: se eu tiver alguma competência como escritor, vai valer a pena daqui a pouco.

Perceba o primeiro sinal de assimetria entre a eletricidade e o magnetismo. A segunda equação afirma que a divergência do campo magnético é SEMPRE nula. Ou seja, o campo magnético SEMPRE é gerado por uma fonte "positiva" (que você pode chamar de pólo positivo ou norte magnético) acompanhada por uma fonte "negativa" (pólo negativo ou sul magnético). Ambos se juntam e resultam em divergência nula. Se você pegar dois ímãs e aproximá-los de uma forma conveniente, vai perceber que algumas regiões vão se atrair e outras vão se repelir. Isso acontece porque o campo magnético é gerado no ímã da maneira descrita pela lei de Gauss para o magnetismo: as cargas magnéticas ao contrário das elétricas, só acontecem aos pares. Mesmo que você quebre um ímã ao meio, o resultado será dois ímãs, cada um com um pólo positivo e um negativo.

A terceira equação é chamada equação de Maxwell-Faraday e afirma que a variação de um campo magnético (representada à direita da igualdade) implica na indução de um campo elétrico.

Na quarta equação, chamada de lei de Ampère-Maxwell, pode-se perceber o segundo sinal de assimetria. Ela determina que o campo magnético pode ser gerado de duas formas: através do fluxo de elétrons, também chamado de corrente elétrica (representada pelo termo J) ou através da variação do campo elétrico (o último termo à direita, acrescentado por Maxwell), como ocorre na equação anterior.

O que se conclui dessas equações, se as compararmos de maneira ingênua, é que não existe um termo de densidade de carga magnética nem de corrente magnética. Em outras palavras não existe carga magnética. As unidades geradoras do magnetismo, como eu já falei antes, só aparecem em pares: os chamados dipólos.

Então eu pergunto: o que podemos fazer para tornar simétricas as equações de Maxwell? Afinal a Natureza não cansa de mostrar sua afinidade inesgotável pelas simetrias. O que acontece se inserirmos à mão um termo de densidade de carga magnética e corrente magnética, dessa forma:



Aí aparecem alguns constantes diferentes porque essas equações estão escritas em um sistema de unidades diferente, mas isso não muda em nada o fenômeno que elas descrevem.

Estas são as equações de Maxwell na presença de MONOPÓLOS MAGNÉTICOS (oh yeah baby!). São perfeitamente simétricas se trocarmos E por B, salvo por algumas constantes (mas vou evitar o detalhe matemático) como era de se esperar. Se existirem cargas magnéticas isoladas, como os elétrons e prótons existem na eletricidade, essas são as equações que descreveriam o eletromagnetismo. Perceba que elas são invariantes por transformações de Lorentz como as equações originais, portanto descrevem a física de referenciais inerciais em movimento relativo.

Mas e daí? Ora, Eduardo, você me mostrou que os monopólos magnéticos são um requisito estético na teoria eletromagnética. É assim que se faz física? Se for bonito, é só colocar à mão?

Ahá. Claro que não caro leitor. No próximo post eu vou falar como os monopólos podem ter surgido quando o universo jovem e homogêneo sofreu uma quebra espontânea de simetria SO(3) e se transformou na maravilhosa bagunça heterogênea que é hoje (heterogeneidade da qual nós somos fruto direto). Também vou falar em outros tipos de defeitos topológicos e nos conceitos geométricos envolvidos (são interessantes). Quem sabe um dia eu chego nas viagens no tempo.


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Link: Artigo de 1861 onde Maxwell deriva suas equações.

Apêndice:

As equações de Maxwell não descrevem a luz só porque os físicos querem e dizem que é assim. Não vou reproduzir os cálculos por razões óbvias (não tenho a intenção de catalogar aqui conhecimento acadêmico), mas todo aluno de começo de curso sabe fazer isso: se você tomar o rotacional das equações de Maxwell-Faraday e Ampère-Maxwell depois substituir as equações de Gauss, usando também a relação para o rotacional do rotacional, chega-se nas seguintes equações:
\Bigg(\nabla^2  - { 1 \over {c}^2 } {\partial^2 \over \partial t^2} \bigg) \mathbf{E} \ \ = \ \ 0
\Bigg(\nabla^2  - { 1 \over {c}^2 } {\partial^2 \over \partial t^2} \bigg) \mathbf{B} \ \ = \ \ 0
Que são equações de onda para os campos eletromagnéticos e descrevem o comportamento da luz. Esse resultado FENOMENAL é fruto da curiosidade e do talento sem precedentes de James Clerk Maxwell, o primeiro nerd.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Série: das equações de Maxwell às viagens no tempo

Como os biólogos insistem em dizer, somos macacos. E como macaco vou COPIAR. Vou iniciar minha primeira série, a tão prometida sequência de posts que vai falar sobre as equações de Maxwell: o conjunto maravilhosamente funcional e elegante de equações organizadas e corrigidas por James Clerk Maxwell (the ultimate NERD) no meio do século XIX.

As equações sugerem a existência de um objeto chamado monopólo magnético, o análogo à carga elétrica para campos magnéticos. Este objeto é um defeito topológico.

Vou falar sobre outros tipos de defeitos topológicos e sobre "topologia" em si: o conceito de métrica, geometria, as formas como estes conceitos abstratos se manifestam no universo e como falhas nessa estrutura representam fenômenos incríveis, dentre eles a viagem no tempo.

Percebam que eu gosto de falar em viagem no tempo. Sim, isso atrai os leitores. Mas tenha em mente que pra mim (e pra qualquer físico sério), a viagem no tempo é o elo perdido (foi mal Waltécio), o santo Graal da física. Nada que deva ser levado a sério, hehehe... Pelo menos por enquanto, durante a pré-adolescência da espécie humana.

Vivemos uma época onde a tecnologia apenas começa a se desenvolver e portanto temos pouco ou nenhum controle do que acontece no nosso planeta. Muito menos dos fenômenos que acontecem entre os titãs magníficos do universo: estrelas, buracos negros, galáxias, nebulosas etc. Para dizer a verdade, temos muita dificuldade em visitar a nossa Lua (em geral isso requer os especialistas mais competentes do mundo, a melhor tecnologia disponível e MUITO dinheiro) e a nossa Lua está praticamente ali ao lado. Para dizer uma verdade ainda maior, estamos descobrindo que temos dificuldade até em sobreviver na Terra sem se auto-destruir. Portanto, manipular supostos defeitos topológicos que aconteceriam num universo densamente energético e usá-los para viajar no tempo (vamos entender isso melhor em seguida) parece fora de questão, então devemos nos concentrar em fazer física séria e benéfica para a humanidade. "Infelizmente" é muito divertido estudar física teórica.

Dessa forma, concluo essa introdução deixando uma opinião pessoal que me fez, desde muito cedo, averso à religiosismos, superstições e ao sobrenatural: o universo real é infinitamente mais bonito e interessante que aquele universo confeccionado na cabeça das pessoas. Vou deixar isso claro nos próximos posts.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

domingo, 3 de maio de 2009

Hehe...

segunda-feira, 16 de março de 2009

Termodinâmica e Hora do Planeta: eu vou apagar tudo!

É o seguinte... As coisas (e as pessoas, que quase sempre são coisas) são feitas de átomos. Os átomos são feitos de partículas, as partículas de partículas menores e assim vai, até onde conseguimos olhar. Essas partículas possuem, dentre outras, a característica mais representativa do comportamento quântico: seu comportamento é estatístico. Não se sabe onde elas estão, ou pra onde vão (ao mesmo tempo), mas você pode tentar calcular a probabilidade de uma delas estar em um determinado lugar. Isso se faz através da integral em todo o espaço do módulo quadrado da função de onda, que é solução da equação de Schrödinger: no caso quântico clássico (que não inclui efeitos relativísticos).

Mas nada disso importa. O que importa é que o conjunto dessa quantidade enorme de partículas, se comportando estatisticamente, em larga escala, ou seja no que chamamos de limite clássico, se manifesta de uma forma mais natural e familiar para nós: termodinamicamente. Em outras palavras, quando estamos no nível de energia em que vivemos (na temperatura ambiente, ou como chamamos, da ordem de ), no mundo onde as coisas são menores que planetas e estrelas e maiores que átomos e moléculas, o que nós observamos desse comportamento quântico (estatístico) das partículas é o calor, a pressão, a temperatura etc. Existe uma ciência (fenomenológica) que regulamenta essa manifestação clássica dos gases formados por essas partículas e essa ciência se chama termodinâmica.

A termodinâmica possui quatro leis. Uma das formulações da segunda lei determina que todo processo desperdiça energia. Não cria, nem mantém constante, mas gasta. É por isso que é impossível construir uma máquina que funcione sem retirar energia de algum lugar. No caso dos mecanismos que encontramos no dia-a-dia, como os motores, a maior parte da energia é dissipada pelo atrito na forma de calor. Outra parte é desperdiçada pelo escapamento, no caso dos carros, na forma de poluição, para encurtar a conversa.

A verdade é que a segunda lei da termodinâmica decreta que não existe energia "limpa". Bom... existem formas de combustível (no sentido de fonte de energia) que não resultam em fumaça, smog, lixo tóxico etc. A mais conhecida dessas fontes de energia, pelo menos aqui no Brasil, é a energia elétrica. Mas em qualquer caso, seja qual for a fonte de energia utilizada, qualquer processo, em um último momento, resulta em um sub-produto inevitável: o calor. Acender uma lâmpada, ligar um computador, uma geladeira, um ar-condicionado, um ventilador... Tudo isso resulta em calor que é absorvido pela atmosfera do planeta.

A poluição pelo calor, especialmente nos últimos anos, tem se mostrado tão desagradável de se presenciar e causado tanta preocupação quanto as formas usuais de poluição pela emissão de monóxido de carbono, CFC e metano.

É por isso que eu estou divulgando aqui a Hora do Planeta. A WWF-Brasil se juntou a instituições de defesa do meio-ambiente em todo o mundo e está promovendo o desligamento de luzes nas casas de TODAS AS PESSOAS, no dia 28 de março de 2009 entre as 20:30 e 21:30 horas, para chamar a atenção das autoridades para os efeitos do aquecimento causado pela poluição emitida pelos seres humanos e mostrar ao mundo que nós brasileiros estamos conscientes do problema.

P.S.: Não esqueci da minha promessa, em um post próximo eu vou falar sobre defeitos topológicos, monopólos magnéticos, cordas cósmicas e como usá-las para construir uma máquina do tempo. É um tema muito interessante e escasso (pelo menos sob uma forma palatável) entre os livros de divulgação da física.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Maxwell

Quando eu estava na graduação tive a sorte de ter alguns professores realmente inspiradores. Alguns realmente marcantes, como o prof. Eugênio R. B. de Mello que acabou se tornando meu orientador e com sua exigência lendária conseguiu colocar na minha cabeça um pouco da física-matemática que me seria tão útil no futuro (e continua conseguindo me ensinar não só física-matemática).

Outro cidadão que teve um papel fundamental na minha formação acadêmica foi o prof. Carlos A. P. Galvão. Foi meu professor de mecânica geral (I e II) e de eletromagnetismo (I e II!). Talvez por ter feito graduação na área de engenharia (ou talvez por ser mais competente que a maioria das pessoas), o prof. Galvão sempre tinha uma forma excepcionalmente eficiente de interpretar e transmitir uma imagem clara das equações de Maxwell (e de quaisquer outros sujeitos que por ventura estivessem sendo estudados). Agora o prof. Galvão está de volta ao seu hábitat natural: o CBPF, mas deixou aqui na UFPB um eterno aluno, admirador e, espero eu, amigo.

Quando vi esse vídeo, não consegui deixar de lembrar dele. Aos desavisados, o vídeo abaixo pode ser interessante para qualquer um (leia-se leigo), mas a sua compreensão total requer conhecimento básico de integrais de superfície, derivadas e alguma familiarização com a teoria eletromagnética. Trata-se de um episódio de uma série de vídeos da Caltech intitulada The Mechanical Universe.



No meu próximo post vou avançar um pouco mais no tempo e vou falar da simetria nas equações de Maxwell e como sua estética sugere a existência de monopólos magnéticos. Também vou falar sobre este e outros defeitos topológicos como as cordas cósmicas (assunto que recentemente voltou a ser hit nas paradas de sucesso acadêmicas) e a máquina do tempo.

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Deus, big bang e a constante cosmológica

Eu sou agnóstico. No sentido de "a-", o prefixo de privação, anteposto a "gnostos" que significar saber, conhecimento. A quantidade de conhecimento que possuo é irrelevante.

Mas também sou agnóstico no sentido mundano do termo. Meu cérebro funciona através de processos puramente racionais quando está determinando o que é fato e o que não é. Portanto não vejo muito sentido em desperdiçar tempo para se tentar descobrir se deus existe ou não. Algumas pessoas acham que não se sabe definir deus, outras acham que deus está no plano do sublime, do etéreo, do angelical e a ciência, como representante da nossa capacidade de saber e entender, está no plano do material, do natural, portanto não é possível usar de experimentação ou lógica para determinar a existência ou não de qualquer entidade divina.

A existência de divindades tem sido uma maneira encontrada pela espécie humana para explicar os mistérios da natureza desde que pintamos pela primeira vez na parede de uma caverna. E quando as primeiras centelhas de racionalidade (no sentido moderno) começaram a aparecer entre os homens, surgiram os tais argumentos, supostamente lógicos, que "provavam" (ou não*) que deus existe. Os mais famosos são, provavelmente, o argumento ontológico e o argumento do desígnio.

O argumento ontológico de Santo Anselmo determinava que

  • [...] se é possível conceber um ser perfeito, ele deve existir—pois não poderia ser perfeito sem acrescentar a perfeição da existência. Esse [...] argumento [...] foi atacado, mais ou menos prontamente, em dois campos: (1) Podemos imaginar um ser absolutamente perfeito? (2) Será óbvio que a perfeição é aumentada pela existência? Para um ouvido moderno tais argumentos pios parecem tratar de palavras e definições, e não da realidade externa.
Sagan, Carl. Broca's Brain, 1982


Já o argumento do desígnio penetra mais profundamente em assuntos que dizem respeito aos fundamentos da ciência e determina que se a Natureza parece ser formada por máquinas à semelhança das máquinas que nós criamos, então o mundo deve ter sido criado por um criador à nossa semelhança:

  • Look around the world: Contemplate the whole and every part of it: You will find it to be nothing but one great machine, subdivided into an infinite number of lesser machines… All these various machines, and even their most minute parts, are adjusted to each other with an accuracy, which ravishes into admiration all men, who have ever contemplated them. The curious adapting of means to ends, exceeds the productions of human contrivance; of human design, thought, wisdom, and intelligence. Since, therefore the effects resemble each other, we are led to infer, by all the rules of analogy, that the causes also resemble; and that the Author of nature is somewhat similar to the mind of man; though possessed of much larger faculties, proportioned to the grandeur of the work, which he has executed. By this argument a posteriori, and by this argument alone, do we prove at once the existence of a Deity, and his similarity to human mind and intelligence.
Hume, David. Dialogues Concerning Natural Religion, Part II-143, 1854


Em seguida Hume submete esse argumento a um ataque devastador, como fez depois dele Immanuel Kant, o que não impediu que a idéia do desígnio [design] continuasse sendo popular nos primeiros anos do século XIX, como por exemplo nos trabalhos de William Paley:

  • Não pode haver desígnio sem designador; plano sem planejador; ordem sem escolha; arranjo sem arranjador; subordinação em relação a um propósito sem algo que possa ter esse propósito; meios adaptados a determinado fim, executando sua tarefa no sentido de realizar tal fim, sem que este tenha sido contemplado, ou que os meios se tenham ajustado a ele. Arranjo, disposição de partes, subordinação dos meios a um fim, relação dos instrumentos a um uso, tudo isso implica a presença de inteligência e mente.

Essa é a famosa idéia do criador relojoeiro**, e não foi até o desenvolvimento da ciência moderna e da teoria da evolução através da seleção natural de Charles Darwin e Alfred Russel Wallace em 1859, que esse conceito aparentemente plausível foi definitivamente refutado.

Como cientista, eu deveria defender a idéia de usar a ciência como meio para entender TODOS os mistérios do universo, por mais religiosa que pareça esta prática. Mas como agnóstico, eu não tenho muito interesse nessa mistura de metafísica e ciência, que tem se mostrado ineficiente perante o teste da história.

O próprio religioso (exceto pelos criacionistas) tem o hábito de rebaixar as pessoas e eventos que considera sagrados, como se fossem parte de um passado intangível. Não só um passado distante, mas um "long time ago in a galaxy far away", ou um passado como aquele onde se passam as histórias de J.R.R. Tolkien. A ciência que hoje é ampla e abertamente aceita por todos na forma de tecnologia e medicina, não tinha validade alguma quando dos acontecimentos descritos nos livros sagrados. Mas de alguma forma esse mundo mágico se modificou e se transformou no que conhecemos hoje: um mundo material regido pelas leis da física.

Quando Einstein publicou a sua teoria da relatividade geral, chegou a conclusão de que o universo não poderia ser estático. Como não conseguia aceitar um universo em expansão ou contração, Einstein propôs a equação de campo modificada:



Que contém o termo com a constante , chamada constante cosmológica, que seria responsável por contrabalancear a ação da gravidade, tornando o universo estático. Teorias mais recentes voltaram a considerar a constante cosmológica como forma de incluir a matéria escura, mas no final da década de 20 a constante cosmológica se tornou uma idéia ridicularizada, com o advento da idéia de que o universo está em expansão e evoluiu a partir de um átomo primitivo, sugerida por Georges Lemaître, um astrônomo, físico e padre católico.

Esta concepção foi confirmada alguns anos depois por Edwin Hubble e o papa Eugenio Maria Giuseppe Giovanni Pacelli (Pio XII) anunciou em um discurso na Pontifícia Academia de Ciências em 1951 que a teoria do universo em expansão e do átomo primordial era uma prova da existência de deus e da criação descrita no gênesis. Apesar de ser um padre, Lemaître era um cientista de verdade e ficou bastante irritado com a confusão feita pelo papa.

Como espécie tendemos a achar que somos especiais, talvez únicos. Que a Natureza gira em torno do nosso umbigo. Mas somos apenas um piscar de olhos na história do universo, um bater de asas na história do planeta Terra. Estamos apenas aprendendo a pensar e a lidar com nossa fragilidade e nossa necessidade de buscar a verdade seja da maneira fácil ou da maneira correta. Precisamos do conforto espiritual ao nos confrontarmos com o derradeiro fracasso evolutivo (algo que somos programados para evitar): a morte como o cessar dos sentidos e das funções fisiológicas.

Todas essas tentativas de justificar as fraquezas da nossa espécie não são suficientes para mudar o fato de que deus se trata apenas de uma hipótese inútil.


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* Uma das manifestações do argumento ontológico de Santo Anselmo é o da existência necessária:
  1. Deus é a entidade mais grandiosa que se pode conceber;
  2. ser necessário é mais grandioso do que não ser;
  3. portanto, deus deve ser necessário;
  4. então deus existe, necessariamente.
Um dos ataques à declaração acima veio do filósofo Douglas Gasking na forma do argumento da não-existência necessária:
  1. A criação do mundo é a maior conquista imaginável;
  2. o mérito de uma conquista é o produto de (a) sua qualidade intrínseca e (b) a habilidade daquele que a desempenhou;
  3. quanto maiores os defeitos (ou deficiências) do criador, mais impressionante é a conquista [subir uma escada, por exemplo, é uma conquista muito mais impressionante se você está numa cadeira de rodas];
  4. o mais formidável defeito que um criador poderia ter seria a não-existência;
  5. portanto, se supusermos que o universo é produto de um criador existente, então seria possível conceber um ser mais grandioso—por exemplo um criador que não existisse;
  6. logo, deus não existe.
** Paley argumentava que a complexidade dos seres vivos implicava na existencia de um criador, assim como a complexidade de um relógio implica na existência de um relojoeiro. Em 1986 Richard Dawkins publicou O Relojoeiro Cego que usa a evolução através da seleção natural para explicar como veio a surgir a complexidade nos animais. Também explica que, ao contrário do relojoeiro que planeja a construção do relógio, a evolução é um processo não planejado, portanto, se houvesse um criador relojoeiro ele deveria ser cego.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

God, the Universe and Everything else

Acabo de descobrir esse colóquio magnífico, chamado God, the Universe and Everything Else ("Deus, o Universo e Tudo o mais"). Desculpem a minha ignorância, mas nunca tinha ouvido falar nele. Acho que já deixei claro que sou "fã" de Carl Sagan. Além disso, ser nerd implica em uma afinidade por Arthur C. Clarke (autor da série de livros Odisséia no Espaço). E como físico, além de nerd, claro que eu respeito profundamente o Stephen Hawking.

Agora imagine você que juntaram esses três camaradas numa conversa de pouco mais de uma hora, falando sobre as coisas demi-importantes da vida...

Vi esses vídeos aqui e não pude deixar de copiar. Senhoras e senhores, lhes apresento a vela no escuro, a chama que dança impetuosa e inexoravelmente no mar negro da ignorância e da pseudo-ciência:

Parte 1:



Parte 2:



Parte 3:



Parte 4:



Parte 5:



Parte 6:



P.S.: A tradução está relativamente pobre em algumas partes, mas nada que atrapalhe o entendimento da conversa.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Os que querem ser cientistas


Só faltou o filósofo. Não sei se à esquerda do sociólogo ou à direita do matemático. Fica a cargo do leitor.

Copiei a tirinha daqui, juntamente com essa piada:

  • Sociólogos querem ser psicólogos porque se você entende o cérebro pode entender a sociedade;
  • Psicólogos querem ser biólogos porque se você entende a vida pode entender o cérebro;
  • Biólogos querem ser químicos porque se você entende a matéria pode entender a vida;
  • Químicos querem ser físicos porque se você entende o universo pode entender a matéria;
  • Físicos querem ser deus;
  • Deus quer ser matemático.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Buracos Negros, wormholes e viagens no tempo


Okay, o círculo preto na folha de papel obviamente não poderia ser nada parecido com um buraco negro. Qualquer pessoa com um mínimo de conhecimento geral poderia ter aconselhado os produtores do curta acima a mudar de título. Wormhole (buraco de minhoca) talvez fosse muito mais apropriado.

Buracos negros são (ou foram) estrelas supermassivas cuja atração gravitacional é tão forte que nem as explosões gigantescas no seu interior são capazes de evitar que acabe colapsando numa região muito pequena. Eles têm pelo menos dez vezes a massa do nosso Sol, mas com um diâmetro de apenas alguns quilômetros. São ditos "negros" porque dentro de uma região chamada raio de Schwarzschild a curvatura do espaço aumenta gradativamente e qualquer forma de matéria ou radiação que venha a entrar nessa região fica presa aí para sempre.

Todos os buracos negros possuem essa região de Schwarzschild. O centro do buraco negro é chamado de singularidade (esse é o termo que se usa na física quando nos referimos a um ponto de divergência, onde algo é infinito, nesse caso a curvatura do espaço). Se não houvesse a região de Schwarzschild em torno da singularidade, ela poderia ser vista por um observador próximo. Tal fenômeno é chamado de singularidade nua e não deve existir segundo a conjectura da censura cósmica. Nada disso é teoria, especulação ou ficção científica. As coisas que eu acabei de dizer são consequência dos cálculos que podem ser feitos a partir da métrica de Schwarzschild (ou no caso mais realista, a métrica de Kerr-Newman, que descreve buracos negros reais com rotação e carga elétrica).

Por causa da região de Schwarzschild em torno dos buracos negros, podemos pensar neles como os bancos de dados do universo. Os cronistas do mundo que guardam cada registro captado desde a origem do universo. Isso acontece porque à medida que um observador se aproxima da singularidade a curvatura aumenta e seu tempo-próprio (o tempo medido pelo seu relógio) passa cada vez mais devagar. Então os buracos negros são como discos de vinil, a cada milímetro de distância do centro existe um anel que contém informações necessárias para se descrever o universo como visto por aquele buraco negro em um momento no tempo. Se o observador está a uma distância da singularidade (dentro do raio de Schwarzschild) e olha por cima dos ombros para o universo, ele vai ver uma paisagem diferente da que veria se estivesse mais longe ou mais perto do centro do buraco e veria o universo mais antigo à medida que se aproximasse. Vale salientar que Stephen Hawking descobriu que os buracos negros na verdade não são completamente negros. Aos poucos eles irradiam a chamada radiação de Hawking que num futuro distante acabaria por esgotá-los. Assim como os CDs piratas e pen drives de vinte reais, os buracos negros não são formas confiáveis de guardar informação.

De toda forma, se aquele círculo preto na folha de papel fosse um buraco negro, muito rapidamente tudo ao seu redor (o sistema solar) seria sugado pela sua imensa força gravitacional e se juntaria à matéria do seu interior.

Já um buraco de minhoca se prestaria muito mais adequadamente ao papel em questão. Também conhecidos como wormholes, são uma previsão das equações de Einstein. Sabemos que nosso espaço é curvo. Quando falo em espaço me refiro ao espaço-tempo, o lugar físico-matemático onde o universo repousa. O espaço-tempo não é plano como uma mesa. Ele possui geometrias complicadas, de modo geral ele é curvo, especialmente próximo às estrelas e planetas; e é essa curvatura a responsável pela força que experimentamos aqui na Terra e que chamamos de força da gravidade. Isso mesmo, a Terra curva o espaço-tempo à sua volta.

Mas isso é um fenômeno local. Globalmente o espaço (supostamente) também tem uma curvatura e é aí que entram os buracos de minhoca. A menor distância entre dois pontos (chamada de geodésica) só é uma linha reta se o espaço é plano. Se, por exemplo, o espaço for esférico a menor distância entre quaisquer dois planos é um arco circular.


Então quando nos movimentamos pelo espaço curvo, na verdade nos movemos através de curvas geodésicas sobre sua geometria.

Os buracos de minhoca seriam atalhos que atravessariam a curvatura do espaço encurtando a distância entre dois pontos, algo como o que acontece com a mancha preta no papel do curta-metragem acima.


Se esses dois pontos forem suficientemente distantes e o espaço-tempo for suficientemente curvo, a ficção científica determina que um foguete lançado através do buraco de minhoca poderia viajar para o passado. Isso vem de um fenômeno (real) chamado contração do tempo. Quanto mais rápido viaja um observador, mais lentamente o tempo passa pra ele. Ao passo que se ele atinge a velocidade da luz (não importam as dificuldades experimentais que tal fenômeno implicaria: gedankenexperiment) o tempo efetivamente pára. Então, supostamente, se um astronauta, passando por um buraco de minhoca, chega do ponto A ao ponto B, antes de um raio de luz viajando através do espaço convencional, então o tempo medido pelo astronauta retrocederia e ele viajaria para o passado.

Enfim... Cuidado com os nomes que você coloca nos seus filmes.

Mythbusters é ciência?


Para quem não conhece, os Mythbusters (ou Caçadores de Mitos, em português) é um programa do Discovery Channel onde dois caras com experiência em efeitos especiais testam mitos comuns do cotidiano como, por exemplo, se um carro com ar-condicionado ligado consome mais gasolina, se é possível atirar duas flechas no mesmo lugar, uma dentro da outra, etc... Inclusive fizeram um excelente trabalho investigando os argumentos e as supostas provas de que a chegada do homem à Lua foi uma fraude arquitetada pela NASA e por um estúdio de Hollywood.

Para quem já viu o programa e tem alguma formação científica, é evidente que eles não tem o rigor necessário para ser considerados cientistas, mas até onde eu assisti, eles nunca demonstraram ter essa pretensão. E como diz o Feynman zumbi da tirinha acima, os Mythbusters estão ajudando a criar um paradigma experimentalista na cabeça das pessoas. Para quem assiste o programa, mesmo sem estar familizarizado com o cientificismo, fica fácil se acostumar a questionar as afirmações e opiniões não testadas que nos são jogadas diariamente. Quem nunca teve vontade de montar seu próprio experimento para sanar uma dúvida pessoal, que atire a primeira pedra.

Deve-se dar o crédito por uma ou outra experiência que ajudam a esclarecer o espectador a respeito de alguns dos mistérios do dia-a-dia e da ciência básica, além de despertar a curiosidade dos jovens (e dos adultos também, acredito) pelo questionamento e pela busca da verdade através do método científico.

De toda forma, escrevi esse post para mostrar a charge acima (copiada descaradamente daqui).

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

O Nobel e a quebra de simetria

Gostaria de fornecer informações mais completas sobre o que falei antes do prêmio Nobel relacionado com a quebra espontânea de simetria.

Em 2008 o prêmio de física foi concedido a um trio de japoneses pelo seu trabalho na busca por entender como as simetrias fundamentais da Natureza são quebradas. Makoto Kobayashi do Japan's High Energy Accelerator Research Organization (KEK) em Tsukuba e Toshihide Maskawa do Yukawa Institute for Theoretical Physics (YITP) na Universidade de Kyoto receberam um quarto do prêmio cada um pela descoberta da origem da "simetria quebrada" que contribuiu para uma preponderância da matéria sobre a antimatéria no universo e que prevê a existência de pelo menos três famílias de quarks na natureza. Essa quebra de simetria é a razão pela qual o universo inteiro existe. Se a simetria permanecesse, quantidades iguais de matéria e antimatéria seriam criadas e se aniquilariam aos pares, resultando apenas em radiação.

Duvido que tenha algum crente, religioso, criacionista, adorador do saci-pererê e da mula-sem-cabeça lendo esse blog, mas caso algum de vocês esteja aí, preste muita atenção no que estou falando pra usar como argumento na sua próxima conversa com um ateu. Essa escolha peculiar do funcionamento das coisas [e bote peculiar nisso, existe apenas uma partícula extra de matéria para cada 10 bilhões de pares de partículas e antipartículas criadas, suficiente para criar todas as galáxias do universo, inclusive você] seria uma pista da existência de um plano inefável arquitetado por um criador? Ou seria coincidência? Ou seria a existência de duas dessas partículas descobertas por Kobayashi e Maskawa? Bom, você não vai querer pensar nessas duas últimas hipóteses, não é verdade?

A outra metade do prêmio foi para Yoichiro Nambu do Enrico Fermi Institute na Universidade de Chicago, pela descoberta do mecanismo [posterioremente chamado de campo de Higgs] de quebra de simetria entre as quatro interações [gravitacional, eletromagnética, forte e fraca] na física de partículas elementares em 1960.

Sua teoria é a semente do mecanismo de Higgs, cuja descrição matemática foi feita quatro anos depois pelo físico americano para explicar a origem das massas das partículas e que hoje faz parte do modelo padrão.

Há quem aposte que o prêmio Nobel dos japoneses é uma prévia do prêmio que deverá ser dado a Higgs em 2009, após a observação do bóson de Higgs no LHC.

Fontes:
http://nobelprize.org/nobel_prizes/physics/laureates/2008/
http://cienciahoje.uol.com.br/129961
http://www.nature.com/news/2008/081008/full/news.2008.1155.html

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Você tem a coragem de ser um cientista?

Enfrentar um problema científico é uma batalha que pode ser bastante injusta. Como Newton disse, e hoje acho que isso é ainda mais válido, estamos "sobre os ombros de gigantes". Newton se referia a Copérnico, Galileu, Kepler, Tycho Brahe, etc... E esses caras realmente foram pioneiros geniais, corajosos [lembre que naquela época o conhecimento científico podia significar vida ou morte, como é mencionado em uma das letras do Haggard sobre Galileu:


Per aspera ad astra... Nunca foi tão difícil trilhar o caminho para o firmamento intelectual onde brilham as estrelas das idéias desses mártires.

Mas hoje os gigantes estão ainda mais altos e para nós humildes estudantes já são colossos inalcançáveis e seguir seus passos requer coragem. É por isso que eu digo que a frase de Newton é ainda mais significativa nos dias atuais. O conhecimento adquirido por aqueles antigos fundadores da ciência, para um aluno mediano, já soa quase como infantil. Mesmo as teorias bem estabelecidas do começo do século XX já são infinitamente mais complexas e isso sem precisarmos recorrer às modernas candidatas a teorias de unificação praticamente ininteligíveis mesmo para o físico mais dedicado.

Então voltamos à minha afirmação inicial de que abordar um problema físico pode significar embarcar numa jornada difícil. Mesmo com o background que os gigantes do passado nos fornecem, nos vemos diante de algo consideravelmente mais grandioso e intrincado: a Natureza. Como ousam os simples homens-macaco adoradores de bananas [como gosta de apontar meu colega Waltécio] tentar desvendar os mistérios da faceira e traiçoeira mãe Natureza? Isso requer coragem e maturidade. Immanuel Kant disse:

  • Enlightenment is man's emergence from his self-incurred immaturity. Immaturity is the inability to use one's own understanding without the guidance of another. This immaturity is self-incurred if its cause is not lack of understanding, but lack of resolution and courage to use it without the guidance of another. The motto of enlightenment is therefore: Sapere aude! Have courage to use your own understanding!
'An Answer to the Question: What is Enlightenment?', (1784). In Hans Reiss (ed.), Kant: Political Writings, trans. H. B. Nisbet (1970), 54.

Sapere aude é uma expressão latina que significa "ouse saber" e essa é provavelmente a sua utilização mais famosa. Oh, caro Kant, gostaria eu de dizer que só me falta a coragem quando eu na verdade me encaixo na categoria que requer entendimento quando tento travar as batalhas propostas pelo meu orientador. Mas eu não sou um bom representante da minha classe, físicos tendem a ser competentes.

Carl Sagan espalhou o pensamento cético e científico com maestria, mas eu acredito, particularmente, que o que nos falta para construir uma sociedade mais elevada é uma boa dose de coragem e orgulho da parte daqueles que fazem ciência. Polanyi disse num discurso

  • [Intellectual courage is] the quality that allows one to believe in one's judgement in the face of disappointment and widespread skepticism. Intellectual courage is even rarer than physical courage.
'A Scientist and the World He Lives In', Speech to the Empire Club of Canada (27 Nov 1986) in C. Frank Turner and Tim Dickson (eds.), The Empire Club of Canada Speeches 1986-1987 (1987), 149-161.

Sofremos o preconceito diário das pessoas que nos cercam e às vezes até da nossa própria família por não termos usado a nossa inteligência para tarefas "mais nobres" como o exercício da advocacia ou da medicina e usamos doses extra de coragem e orgulho para enfrentar cada novo dia.

Pra quem já assistiu The Big Bang Theory, vale lembrar o diálogo entre Sheldon e a irmã:


-I want you to know I'm very proud of you.
-Really?
-Yeah, I'm always bragging to my friends about my brother the rocket scientist.
-You tell people I'm a rocket scientist?!
-Oh... Yeah...
-I'm a THEORETHICAL PHYSICIST!
-What's the difference?
-WHAT'S THE DIFFERENCE?! My God!!! Why don't you just tell them I'm a toll taker at the Golden Gate Bridge??! Rocket scientist... How humiliating...


Físicos são particularmente orgulhosos, mas isso deve valer para os outros tipos de cientistas [vou evitar o bairrismo aqui e não vou citar Rutherford: All science is either physics or stamp collecting] e ISSO é o que nos move através das adversidades que a sociedade E A NATUREZA nos impõem. Nós quebramos o código de deus (eca, falo sobre deus outro dia) e mesmo que isso não compre muitos carros de luxo ou mansões, é isso que nos separa dos animais. Não é a intencionalidade, a capacidade de usar ferramentas ou de se comunicar. Nós somos superiores porque somos ORGULHOSOS, porque olhamos para o céu com curiosidade e ansiedade, não mais com a contemplação boba e ignorante do macaco. Não imaginamos que o céu é um véu negro cheio de furos, mas tentamos imaginar qual seria a maneira mais inteligente de colonizar Titã.

Orgulhe-se, você faz ciência! Deixe que todos vejam isso!

domingo, 4 de janeiro de 2009

WTF is this?!


Eu respondo, é uma espécie de barata d'água gigante, da família dos belastomatídeos. Mas parece mais uma quimera, parte escorpião, parte louva-deus, parte barata cascuda. Tirei essa foto alguns anos atrás em frente a uma loja de conveniências perto da universidade e nunca tive um blog para mostrá-la a ninguém. Desde então virei um fã dessas criaturas completa e indubitavelmente repugnantes.

Para se ter uma idéia do que essa "baratinha" é capaz de fazer, além de se alimentar de insetos, ela usa esse sifão que sai da sua parte posterior para caçar PEIXES. Isso mesmo, a bichinha preda peixes. Coisa que nem Bear Grylls que é da SAS consegue fazer com eficiência.

Que nojo desgraçado.

P.S.: Não recomendo que busquem outras fotos desse monstrengo no google. Principalmente porque depois do acasalamento, o macho carrega os ovos nas costas. É uma coisa bizarra de se ver.

P.P.S.: Não é tão ruim assim, mas eu sou físico e não biólogo, portanto entendam o "nojinho" meio fruta.

sábado, 3 de janeiro de 2009

Quebra de simetria... E daí?

Como diria o locutor do telecurso de matemática, lá por volta das cinco da manhã: vamos pensar um pouco.

Se você está lendo esse blog, existe a chance (e ela não é pequena) de você ser um NERD, assim como eu. Nerd de verdade, fã de Tolkien, leitor assíduo de Carl Sagan e de uma horda de escritores de ficção científica que povoaram a cabeça das pessoas ao longo da história com monstros que habitam os quatro cantos do universo.

Ou você (assim como eu) pode fazer parte de uma classe (em ascenção) de nouveaux nerds que, além das características anteriores, tem uma coleção enorme de discos de Black Metal, Viking Metal, etc Metal; já leu todos os livros de Nietzsche e os mais interessantes de Sartre, sabe programar em pelo menos três linguagens diferentes, adora encher a cara de cerveja nos botecos mais obscuros da sua cidade e, possivelmente, é físico. Sim, nós somos os nerds do pós-apocalipse.

Se tudo isso tem algum significado para você, você também deve ter uma "preocupação" recorrente entre essas pessoas que passam tempo demais lendo e sentados ao computador: você tem uma barriga saliente. Você olha no espelho e encontra uma protuberância onde os filmes de Hollywood afirmam que você deveria ter um tanque de lavar roupa. Você é um corpo supermassivo.

Se esse é o seu caso, não culpe a cerveja (ou o tira-gosto), não culpe a comida da sua esposa, nem o palhaço assustador do McDonald's. A culpa é da quebra espontânea de simetrias contínuas! Como eu já falei em um post anterior, quando um sistema inicialmente simétrico colapsa num estado de vácuo, o mecanismo de Higgs se encarrega de gerar uma partícula massiva chamada Bóson de Higgs (sim, é aquela do LHC), a chamada partícula de DEUS. Eca.


Enfim, à despeito do fato da partícula ser de DEUS (eca), ela é encarregada de atribuir massa à todas as partículas que possuem massa no universo. Inclusive às partículas que constituem a sua pança supermassiva, hahaha!

O LHC (Large Hadron Collider) foi construído, entre outras coisas, para testar a existência do bóson de Higgs, que é uma partícula muito "pequena" e requer muita energia para se detectar. Infelizmente ele ainda não está completamente operacional, nem derreteu o universo, menos ainda criou um buraco negro em Genebra... Inclusive o prêmio nobel de 2008, Yoichiro Nambu, está relacionado com a quebra de simetria (da simetria quiral) e com o bóson de Higgs. Entre outros, Nambu deveria ser um dos premiados caso se confirme a existência do bóson de Higgs.

Enfim... Minha resolução de final de ano inclui ingerir menos bósons de Higgs em 2009 e quem sabe diminuir as minhas chances de sofrer de câncer no futuro (sim, sobrepeso é um fator "carcinogênico").

E por falar em DEUS (!!!)... Vou falar mais sobre ele outra hora.

Rare Book Room

Certa vez, resolvi comprar uma dessas edições modernas do Principia Mathematica de Newton, como forma de honrar minha coleção de livros com uma obra antiga, importantíssima e completamente revolucionária. Nada menos que a primeira obra verdadeiramente científica, nos moldes do método científico moderno.

A verdade é que a leitura desse tipo de livro (com conteúdo essencialmente matemático) é dificílima, a linguagem é brutalmente arcaica se comparada com a linguagem matemática moderna, os desenhos são criptografias indecifráveis e não acrescenta muita coisa ao leitor além da oportunidade solene de se ler um livro com quase 400 anos que transformou a humanidade para sempre.

Com esse comentário em mente, descobri um site relativamente inútil, mas que é bom saber que existe. Chama-se Rare Book Room e tem uma coleção relativamente extensa de digitalizações de várias obras raras e antigas mas que já não servem mais para nada (com o perdão do sacrilégio).

Alguns exemplos são:

"Os elementos" de Euclides;
"Construções com régua e compasso" de Galileu;
"Arte combinatória" de Leibniz;
"Logaritmorum" de Napier;
"Da simetria" de Durer.

Além de outros exemplares de várias áreas: arte, literatura, medicina, etc. Vale a pena dar uma olhadinha.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Aliás, Os Simpsons também!

Eu considero Os Simpsons pura genialidade.

Carl Sagan já fez isso!

Sim, eu sou um físico e estou ciente de que apenas a física é uma ciência. Mas a biologia também é qualquer coisa de divertido. Especialmente a evolução.

O fim da física.

Isso era um comentário que fiz no Macaco Alfa, mas achei interessante registrar aqui:

Falar em fim da ciência, uns 10 anos atrás eu li "O Fim da Física" do Stephen Hawking. Uma extensão física do problema que você descreveu no seu post. Na verdade seria uma das possíveis raízes do problema.

Nessa época as supercordas estavam começando a se popularizar em meios não-acadêmicos como uma teoria de grande unificação. Por "grande unificação" você entende a unificação da mecânica quântica e da relatividade geral. Segundo Hawking esse seria o primeiro passo para se escrever uma Teoria do Tudo (carinhosamente chamado de TOE: theory of everything, entre os entusiastas); a equação final, de onde todas as equações poderiam ser deduzidas como um caso particular. Uma única equação capaz de explicar tudo no universo, a resposta final para todas as perguntas; o fim da física/ciência. Esta equação é muito frequentemente chamada pela mídia de divulgação de o SANTO GRAAL DA FÍSICA. Eca.

Claro que hoje em dia o oba-oba passou (ou diminuiu, ao ponto que nunca mais li ou ouvi sobre isso) e todo mundo tem consciência de que mesmo depois de uma unificação (coisa que não deve acontecer tão cedo), construir uma teoria do tudo demoraria eras e mais eras. Gerações e mais gerações de físicos dedicados, com ajuda de vários monolitos como o da Odisséia no Espaço.

P.S.: Vale lembrar que essa história de fim da ciência é recorrente. O caso mais esdrúxulo que eu conheço aconteceu quando Lord Kelvin disse que no final do século XIX já se sabia tudo o que havia pra saber. Exceto por duas pequenas "nuvens negras no horizonte da ciência": a dificuldade em obter teoricamente a curva da radiação emitida por um corpo negro e explicar os resultados do experimento de Michelson-Morley. Dessas duas "pequenas" nuvens negras saíram "apenas" duas igualmente "pequenas" teorias: a teoria quântica e a relatividade especial.

Mas o que é a quebra espontânea da simetria?

Simplificando o conceito, a quebra acontece quando um sistema encontra-se em um equilíbrio instável (falso vácuo) e pode escolher com igual facilidade entre dois ou mais (infinitos até) estados de equilíbrio estável (vácuos verdadeiros). Se você entendeu isso, você já sabia o que era a quebra espontânea de simetria.

Se você não entendeu, vamos desenhar. Imagine um morro. Mas que seja um morro matemático, perfeito nos mínimos detalhes e perfeitamente simétrico. Agora imagine que você conseguiu equilibrar no cume deste morro uma bolinha de gude (matematicamente perfeita). Este é o tal equilíbrio instável. Instável porque qualquer perturbação vai fazer a bolinha ir embora e não voltar mais. Se o morro for como o desenho acima, existem infinitos vácuos verdadeiros acessíveis à sua bolinha de metal. Existe um vale contínuo onde a bolinha pode cair e entrar num equilíbrio estável. Isso significa que o sistema possuía uma simetria contínua (e não uma simetria discreta).

Classicamente isso é rigorosamente verdadeiro. Quantum-relativisticamente, isso é apenas uma alegoria. O morro é um potencial, a bolinha é uma partícula, etc. No caso quântico da quebra de uma simetria contínua o mecanismo de Higgs gera massa: o famosíssimo bóson de Higgs. Lembra do LHC?

Vou tentar direcionar esse blog num sentido menos burro que o exemplificado nesse post. Burro porque esse tipo de abordagem do conhecimento científico é inútil. Tanto para o especialista que já sabe disso, quanto para o leigo que não vai entender. Com sorte vou conseguir IMITAR o meu amigo Waltécio e escrever coisas interessantes aqui.

Em minha defesa, precisava explicar o famigerado título do blog e não sei mais se tenho saúde ou paciência para incorporar Stephen Hawking. Acredito que a física contemporânea seja um assunto a ser abordado com muito cuidado. Mas de toda forma, está aí a minha declaração.

A simetria e os poliedros

A palavra simetria deriva do grego sun (que significa "com", ou "junto") e metron ("medida"), formando summetría, que originalmente denotava uma relação de comensurabilidade (significado usado por Euclides nos Elementos, e.g.). Rapidamente o termo adquiriu o sentido mais geral e abrangente de uma relação de proporção baseada nos números inteiros com a função de harmonizar deferentes elementos em um todo. Desde o princípio, a simetria esteve fortemente relacionada com a harmonia, a beleza e a unidade. E isso foi prova decisiva do seu papel nas teorias da Natureza.

No Timaeus de Platão, por exemplo, os poliedros regulares ocuparam lugar central na doutrina dos elementos naturais, as proporções que eles contêm e a beleza das suas formas: o fogo tem a forma do tetraedro regular, a terra tem a forma do cubo, o ar tem a forma do octaedro regular, a água tem a forma do icosaedro e o dodecaedro regular representa a forma de todo o universo. A história da ciência também fornece outro exemplo paradigmático do uso dessas figuras como elementos básicos da descrição física: o Mysterium Cosmographicum de Johannes Kepler apresenta uma arquitetura planetária baseada em cinco sólidos regulares.

De uma perspectiva moderna, as figuras regulares usadas na física de Platão e Kepler pelas proporções matemáticas e harmonias que elas contêm (e as propriedades e beleza relacionadas à sua forma), são também simétricas num outro sentido que não tem a ver com suas proporções. Na linguagem da ciência moderna, a simetria de figuras geométricas--como a dos polígonos e poliedros regulares--é definida em termos da sua invariância sob grupos específicos de rotações e reflexões. Além da antiga noção de simetria usada pelos gregos e romanos (até o final da Renascença), uma noção diferente de simetria emergiu no século XVII, baseada não em proporções, mas em uma relação de equivalência entre elementos opostos, como as partes esquerda e direita de uma figura. Essencialmente, as partes são permutáveis com respeito ao todo, preservando a figura original. Essa noção posterior se desenvolveu, após muitas etapas, até o conceito encontrado hoje na ciência. Uma etapa crucial foi a introdução de operações matemáticas específicas, como as reflexões, rotações e translações, usadas para descrever com precisão a forma como as partes permutam. Como resultado, chegamos a uma definição da simetria de uma figura geométrica em termos da sua invariância quando partes iguais são permutadas de acordo com uma das operações específicas. Então, quando as duas metades de uma figura bilateralmente simétrica trocam de lugar, recupera-se a figura original e a figura é dita invariante sob reflexão. Isso é conhecido como noção cristalográfica de simetria, pois foi no contexto do desenvolvimento da cristalografia que a simetria foi, pela primeira vez, definida e aplicada.

O próximo passo foi a generalização dessa idéia através da definição da teoria de grupos, que surgiu seguindo o desenvolvimento do conceito algébrico de grupo ao longo do século XIX, e o fato de que as transformações de simetria constituem um grupo. Por exemplo, a simetria de reflexão tem agora a definição precisa em termos da invariância sob um grupo de reflexões. Finalmente, há uma relação íntima entre a noção de simetria, equivalência e grupo--um grupo simétrico induz uma divisão entre classes equivalentes. Os elementos que são permutados pelas transformações de simetria são conectados por uma relação de equivalência, formando, então, uma classe de equivalência.

Apesar de a teoria de grupos ter se mostrado eficiente na ciência moderna, note que a simetria permanece ligada à beleza (regularidade) e unidade, no sentido de que os elementos distintos (mas "equivalentes") das transformações de simetria são relacionados entre si e ao todo, formando uma "unidade" regular. A forma como a regularidade do todo surge é ditada pela natureza do grupo de transformações em questão. Resumindo, uma unidade de elementos diferentes e equivalentes é sempre associada com simetria, seja no sentido moderno ou antigo; a forma como essa unidade é entendida e como os diferentes e equivalentes elementos são escolhidos determinam a simetria resultante e em que ela consiste.

Considerações acerca da simetria dominam a física moderna fundamental, tanto na teoria quântica quanto na relatividade. Mesmo os filósofos estão agora começando a prestar cada vez mais atenção em assuntos como a significância da simetria de gauge, da identidade de uma partícula quântica sob a luz da simetria de permutação, de como interpretar a violação de paridade, ou do papel da quebra de simetria. Esses assuntos remontam diretamente aos problemas tradicionais da filosofia da ciência, incluindo o status das leis da Natureza, as relações entre matemática, física teórica e o mundo e a forma como a matemática dita a física.

Para a física, além de representar a própria "definição" da beleza presente na Natureza, a simetria se mostra uma ferramenta muito poderosa (como mostra o teorema de Noether), senão essencial, quando se busca estudar determinados aspectos do universo. Essa idéia tão fundamental nos motiva a tentar compreender como e por que alguns sistemas quebram seus padrões de simetria.

Hello World.

Meu primeiro relatório de iniciação científica, de título homônimo a este blog, começa com as seguintes citações:



  • On n'étudie pas la nature parce que c'est utile, mais parce qu'elle est source de joie, et elle est source de joie parce qu'elle est belle. Si la nature n'était pas belle, elle ne vaudrait pas la peine d'être connue, la vie ne vaudrait pas la peine d'être vécue. (Jules Henri Poincaré, 1854 - 1912)

  • Those who find beautiful meanings in beautiful things are the cultivated. For these there is hope. They are the elect to whom beautiful things means only Beauty. (Oscar Wilde, The Picture of Dorian Gray, 1945)

  • Contraria non contradictora sed complementa sunt. [Os contrários não são contraditórios, são complementares.] (Niels Bohr, 1885 - 1962)



Fico satisfeito em iniciar este blog/verme recitando esta oração.